terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Precisamos falar sobre pedofilia


Devido ao episódio ocorrido no Big Brother Brasil sobre o qual falei no texto anterior, em que Ana Paula chama Laércio de pedófilo, uma discussão surgiu nas redes sociais: o que é pedofilia e o que leva um indivíduo a ser pedófilo?

Por se tratar de um desejo sexual tabu, pouco se fala e muito se equivoca na hora de tratar desse problema. Em partes, porque o senso comum tende a generalizar as coisas e em partes porque nossa atitude, diante do comportamento pedofílico, é um tanto quanto histérica e pouco racional.

Não estou, em hipótese alguma, defendendo a pedofilia. O que defendo é o esclarecimento sobre ela para que possamos justamente refletir sobre as melhores soluções possíveis no que concerne ao tratamento e mesmo à punição de pedófilos. A generalização acrescida à demonização do pedófilo faz com que as coisas piorem: porque evitamos compreender tal comportamento, somente nos voltamos para sua realidade quando o abuso infantil acontece e o sujeito é condenado, quando já é tarde demais.

O termo "pedofilia" foi cunhado pelo sexólogo Richard von Krafft-Ebing em 1886. Ele designa aquelas pessoas que sentem atração primária por crianças impúberes ou no início da puberdade (por volta dos 13 anos de idade). A "filia", no grego, pode significar tanto amor como amizade.

Os motivos de uma pessoa ser pedófila não foram ainda completamente descobertos, mas pesquisas realizadas ao longo de mais de uma década pelo Dr. James Cantor, do CAMH (Centre for Addiction and Mental Health), indicam que se trata de algo tão arraigado quanto a orientação sexual, de cunho biológico e, portanto, identificável no cérebro.

Muitas pessoas, obviamente, jamais vão revelar que são pedófilas, nem mesmo a um terapeuta ou psiquiatra. Sendo assim, não existe um estudo preciso sobre quantos pedófilos existem no mundo e as estatísticas variam de 1% a 20% da população mundial. A falta de pesquisas é justificada, por algumas instituições, pelo fator econômico atrelado ao tabu: se uma organização conduzir um estudo sobre pedófilos pode passar a impressão de que, ao querer entendê-los, é empática a eles, o que certamente levaria empresas a deixarem de contribuir com doações.

Nos poucos estudos realizados com voluntários, descobriu-se que cerca de 17% dos homens que se consideram "normais" (ou seja, que não se descrevem como pedófilos) seriam capazes de se excitar sexualmente por alguma criança abaixo dos 12 anos de idade.

Uma pesquisa feita em 2006, por Becker-Blease e colegas, usando um questionário preenchido por 531 homens universitários, revelou que 7% dos participantes admitiram sentir atração sexual por "crianças pequenas", enquanto 18% disseram ter fantasias sexuais com crianças - dos quais 8% se masturbavam com essas fantasias e 4% admitiam que fariam sexo com uma criança "se ninguém descobrisse".

Há ainda menos estudos tratando da pedofilia entre mulheres. Em 1996, uma pesquisa feita por Smiljanich e Briere sugere que 3% de um grupo de 180 mulheres admitem atração por "crianças pequenas" e 4% usam pornografia infantil.

Lembrando que todos os estudos foram feitos com voluntários e que nem todos os pedófilos revelam seu desejo, essas estatísticas provavelmente mostram um número muito menor do que a realidade. A conclusão? A pedofilia não é rara, mas recorrente entre as pessoas. O que acontece é que a sociedade não tem a menor ideia do que fazer com pedófilos que não cometem crimes.

Ninguém se importa em procurar entender e ajudar aqueles pedófilos que não agem em função desse desejo sexual e que precisam, com urgência, de tratamento para que aprendam a controlar seus impulsos e não cometam abuso contra crianças. Contudo, porque enxergamos a atração sexual por crianças como um crime por si só, partimos diretamente para a culpabilização e desejo de punição, pulando o referido tratamento que pode ser crucial para se reduzir o número de abusos.

Devemos nos lembrar, ainda, que o fator cultural faz com que nem todo abusador de crianças seja, necessariamente, pedófilo - da mesma forma que nem todo pedófilo é um abusador.

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