quinta-feira, 2 de maio de 2019

A perseguição ideológica no MEC


Não é de hoje que a comunidade acadêmica está apreensiva com a realidade do ensino superior no país. Os cortes nos investimentos com pesquisa vêm ocorrendo gradativamente, desde 2014, mas o bloqueio das verbas nas universidades anunciado por Abraham Weintraub, desta vez, tem uma forte motivação ideológica.

Antes de ser nomeado, Weintraub já espalhava suas ideias baseadas em teorias da conspiração, acreditando que o mundo é dominado por comunistas – que estariam à frente até dos grandes bancos (!?). Agora, no Ministério da Educação (MEC), ele tem condições de levar a cabo a guerra cultural que prega, baseado principalmente nos "ensinamentos" de Olavo de Carvalho. Em suma, Weintraub soma à paranoia comunista que perpassa o governo de Jair Bolsonaro.

A pretensão de, inicialmente, barrar 30% da verba destinada a três universidades federais (UnB, UFF e UFBA), sob a vaga justificativa de que as instituições estariam promovendo "balbúrdia", não tem outra motivação que não a ideológica. Com os questionamentos em reação às declarações, Weintraub decidiu pelo contingenciamento de todas as universidades e institutos federais.

Contudo, isso não bastou para que a tal guerra cultural se arrefecesse: o ministro declarou que considera cortar bolsas de pesquisas com "viés ideológico". Sem estabelecer quaisquer critérios, já sabemos que quem irá determinar esse viés é o próprio Weintraub e sua equipe, de modo que as Ciências Humanas serão diretamente afetadas pela visão extremamente enviesada que agora ocupa o MEC.

De modo simplificado, podemos dizer que dois fatores estão relacionados ao ataque que testemunhamos, agora, à educação em geral, e em especial ao ensino superior.

De um lado, temos uma classe média convencida de que existe uma doutrinação esquerdista em curso – que explicaria os anos de governo do PT no Brasil. Esse grupo, inflamado pelos discursos de Olavo de Carvalho e de seus seguidores, propagado pelas redes sociais e pelo YouTube e reforçado em livros que se tornaram best sellers, tem como base justamente uma intelectualidade paralela, que usa a internet de modo estratégico para se espalhar. Essa pseudo-intelectualidade desdenha da academia –seja por não conseguir adentrar no sistema, seja por não conseguir se sair bem uma vez que nele adentra – e se esforça para deslegitimar a obra e o legado de autores associados à esquerda, como Paulo Freire.

De outro lado, podemos ver como o próprio Jair Bolsonaro reflete uma outra classe, esta anti-intelectual e iletrada, como apontado por Jessé de Souza em A elite do atraso, que ao mesmo tempo inveja e odeia o conhecimento que não foi capaz de obter. Esse grupo, em sua maioria, é composto por pessoas que vieram da classe média baixa ou que ainda pertencem a ela e que se sentem empoderadas pelo anti-intelectualismo do presidente, confundido com autenticidade.

Esses dois lados acabam por se complementar, na medida em que essa intelectualidade paralela encabeçada por Olavo de Carvalho mantém um discurso simples e impactante o suficiente para que suas frases de efeito sejam reproduzidas também pelos anti-intelectuais, conquistados pelas palavras de ordem e "mitadas". Além disso, as fake news criadas por esses novos formadores de opinião encontram, nesse balaio,  um terreno bastante fértil, adubado pelo ódio, pela falta de pensamento crítico e pela dificuldade de se filtrar a veracidade das informações e notícias compartilhadas nas redes sociais.

Com a troca do ministro da Educação, passamos de um sujeito inepto e incompetente para um que parece ávido para "mostrar serviço", mas que é igualmente paranóico quanto ao projeto de gestão iniciado com discursos alarmistas em torno de supostas doutrinações. O ataque a intelectuais da área de Ciências Humanas, em especial àqueles que desenvolvem pesquisas de cunho sociopolítico, bem como aos estudantes das instituições públicas, alcançou um nível mais profundo e potencialmente perigoso.

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