sábado, 23 de julho de 2016

Pastor coloca faixa incitando a morte de homossexuais na frente de igreja, na Bahia


Em Porto de Sauípe, litoral norte da Bahia, um pastor evangélico colocou, do lado de fora da igreja que dirige, mensagens condenando a homossexualidade, as quais estariam contidas na Bíblia. Na faixa, atribuída a Levítico 20:13, lê-se "Se um homem tiver relacionamento com outro homem, os dois deverão ser mortos por causa desse ato nojento; eles serão responsáveis pela sua própria morte". Há ainda uma outra placa, apoiada no chão, em que está escrito "Você é livre para fazer suas escolhas, mas não é livre para escolher as consequências".

A igreja, que pertence à Congregação Batista Bíblica Salém, foi denunciada ao Ministério Público da Bahia, por conta da mensagem endossada pelo pastor. Segundo a promotora e coordenadora do Centro de Apoio aos Direitos Humanos do MP-BA, Márcia Teixeira, será feita apuração do caso, a fim de se analisar a possibilidade de uma abertura de inquérito civil contra a instituição.

A promotora afirma que estimular a violência é um crime previsto no Código Penal (Artigo 286), apesar de o pastor Milton França insistir que "não tem lei que tire essa placa daí".

O posicionamento do pastor mostra como líderes religiosos usam os ensinamentos bíblicos de maneira desonesta para justificar suas atitudes discriminatórias. Os recortes e as interpretações direcionadas, supervalorizando determinados trechos, servem a esses fundamentalistas como formas eficientes de controle dos fieis.
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Uma busca na internet pelo trecho copiado pelo pastor Milton França, oferece uma outra tradução, de significado semelhante:
Quando também um homem se deitar com outro homem, como com mulher, ambos fizeram abominação; certamente morrerão; o seu sangue será sobre eles.Levítico 20:13-13 
O livro do Levítico tem um contexto bastante específico, por relatar o sistema de leis que Moisés transmitiu ao povo de Israel, tendo as recebido de Deus. Nele constam sacrifícios, ofertas, pecados, regras morais, comportamentais e de alimentação, religiosas e festivas que governariam o povo. Sendo assim, normas como reservar os sábados, não consumir nenhuma comida que tenha sido guardada há três dias ou mais, não oprimir, não roubar, não mentir, não guardar ira contra o próximo, não misturar sementes ao semear, não usar roupas com tecidos misturados, não praticar adultério e assim por diante.

É importante levar em consideração que A Bíblia, como texto, foi produzida em um determinado período e não está isenta de um contexto. Soma-se a isso a questão linguística: ela foi escrita em três idiomas diferentes, aramaico, hebraico e grego, tendo ainda vocábulos emprestados do latim. Segundo o Reverendo Márcio Retamero (no documentário "Bíblia e homossexualidade: exegese e hermenêutica", de 2012), o Antigo Testamento foi escrito em hebraico e o Novo Testamento em grego, sendo que a geração de Santo Agostinho fazia a leitura da Bíblia em grego – idioma no qual o próprio Agostinho revelou em seus textos ter dificuldade. Foi Agostinho, especificamente, quem passou a associar o termo "sodomita" a indivíduos que praticassem atos sexuais "não naturais" (além do sexo anal, isso incluiria também sexo oral ou qualquer outro ato que não fosse a penetração "tradicional").

O fundamentalismo religioso, linha de pensamento seguida por muitas igrejas evangélicas no Brasil, é um fenômeno recente, da segunda metade do século XX, que emergiu nos Estados Unidos em reação ao método histórico-crítico de leitura da Bíblia. A proposta de retorno aos fundamentos das escrituras fundamenta-se em uma leitura literal, contudo, essa interpretação parece só se aplicar a trechos deliberadamente escolhidos, ao passo que outras passagens são analisadas de maneira contextual.

Fundamentalistas, por exemplo, falam literalmente da condenação à homossexualidade citada em Levítico, mas não fazem a mesma interpretação literal para o impedimento de se aparar a barba, o consumo de carne de porco, o apedrejamento à mulher que engravida antes do casamento, entre outras coisas expressas no mesmo livro - muitas delas devendo ser, inclusive, punidas com a morte por apedrejamento.

Curiosamente, o trecho em questão condena o ato entre homens, mas nem sequer menciona mulheres - ou seja, a abominação não se estende às lésbicas. Uma justificativa para o estabelecimento dessa regra em específico, seria o fato de relações sexuais entre homens fazerem parte de rituais pagãos - quando uma mulher não engravidava, ela seria considerada a primeira responsável por sua falta de fertilidade e, como tratamento, deveria manter relações com o sacerdote; no caso de o ritual não funcionar, isso indicaria que o homem, e não a mulher, teria problemas de fertilidade e, por esse motivo, ele então deveria ter uma relação sexual com o sacerdote.

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